Privatizações não são panacéia de solução da dívida. “Torrar” patrimônio nunca foi solução!
Artigo do Presidente da Confelegis, Antonio Carlos Fernandes Jr “ Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo neste domingo, nosso Presidente interino Michel Temer, aventa a possibilidade de privatização
das “jóias da coroa” no setor aeroportuário: os aeroportos Congonhas, em São Paulo, e Santos Dumont, no Rio de Janeiro, de intenso tráfego garantido devido à ponte aérea.
Essa disposição, que vem à frente de outras similares, não é
um bom sinal. Não se conhece nenhuma história com bom
final de quem vende patrimônio para liquidar apenas juros.
Uma coisa é reformar o Estado e sua estrutura para tornar o
país mais competitivo e capaz de entregar mais e melhores
serviços para os seus cidadãos. Ou para priorizar
investimentos cruciais em educação e tecnologia, por
exemplo, que podem deixar ganhos sociais importantes para
as próximas gerações.
Completamente diferente é liquidar seu patrimônio para
“enxugar gelo”.
Só chegamos ao atual ponto de descalabro da dívida pública
e de fragilidade de setores do Estado pela impunidade política.
É a impunidade de agentes políticos que acreditaram que,
com o voto, tudo era permitido. Inclusive realizarem
sistematicamente más gestões, seja nos municípios, Estados
ou na União.
Gestões de desperdício, de obras e obras iniciadas sem que
as anteriores fossem finalizadas, de grandes contratos e
grandes financiamentos de objetivos temerários, mas que
serviram de forma
sucessiva para financiamento de campanhas, poder partidário e enriquecimento de grupos privados que, em atitude de hipocrisia pura, apresentavam-se para o mercado privado como tendo excelência e gestão e exemplo de meritocracia.
Neste processo houve violenta ocupação política de áreas sensíveis da administração pública. Foram postos em estatais, autarquias e setores chaves, profissionais que agiam muito mais como cabos eleitorais, ao invés de como servidores da sociedade.
Regulação, controle, obrigações de transparência, fiscalização, judicialização e punição rigorosa das improbidades, são fatos ainda bem recentes e em uma luta diária contra uma cultura de apropriação do que é público pelos interesses privados. Primeiro é preciso “privatizar” os interesses privados que se encontram encapsulados dentro do aparelho do Estado, trabalhando pelos seus interesses e não pelo que é público. Segundo a OCDE, cerca de 40% dos recursos dos investimentos públicos no país são desviados.
Lideranças dos servidores públicos reconhecem que precisam estar mais próximas da sociedade, tornando-se aliados diretos para que o Estado funcione devidamente, entregue serviços e arrecade
absolutamente de forma justa e somente o necessário. O Estado não precisa ser grande ou pequeno, precisa ser eficiente.
Justamente por isso, é preciso na realidade de hoje se manifestar com clareza.
Se necessário é, um duro ajuste no orçamento público, que o mesmo recaia de forma equilibrada e proporcional sobre a sociedade como um todo.
Recaia sobre os agentes privados que se beneficiam de empréstimos públicos incentivados e com recursos dos próprios fundos dos trabalhadores, sobre os setores industriais que tem subsídios de impostos de forma indiscriminada por períodos de tempos alongados e sem serem estratégicos, sobre os detentores da dívida pública que fizeram deste processo uma especulação sem transparência e controle, e muitas vezes em sintonia com gastos em descalabro, tolerados por ocupantes eventuais do Ministério da Fazenda e Secretaria do Tesouro.
É preciso endurecer no mais alto rigor possível as punições criminais e administrativas sobre os agentes políticos com evidente má gestão. Onde trabalham de forma irresponsável pelo endividamento do Poder Público para gerar ganhos privados. Só o prejuízo do Estado gera o lucro de terceiros... É preciso aumentar a pena de suspensão dos direitos eleitorais. É preciso trabalhar pelo fim desta impunidade.
É preciso punições muita mais rigorosas contra a sonegação existente no país e encurtar os processos de judicialização da contestação tributária. Só serve aos sonegadores e à fiscalização eventualmente permeável à corrupção.
É preciso maior justiça fiscal, com o aumento do recolhimento de impostos das camadas mais privilegiadas da sociedade, que muitas vezes enriqueceram através de relações pouco republicanas com o Estado.
Um Governo tem legitimidade política quando pede iguais sacrifícios a todos, e não apenas a quem não tem poder econômico. E para ter liderança política, precisa começar repactuando o maior custo do
orçamento público, que é o pagamento da dívida pública em níveis aceitáveis, da mesma forma que ocorreu com outras nações do mundo. O primeiro passo seria aceitar uma auditoria que corrija distorções do passado.
Venda de patrimônio público é última medida e não a primeira.
Privatização e concessões à sociedade para operar serviços sempre se mostraram importantes e relevantes, afinal, o esforço público é a soma de Estado e Sociedade, escolhendo o melhor modelo para cada setor. Porém, o sucesso para tanto depende de políticas mais amplas.
Acreditamos no fortalecimento das estruturas públicas, na sua profissionalização, na autonomia de fiscalização e auditoria, na redução do uso abusivo e partidário das políticas públicas, na otimização do uso dos recursos do contribuinte e não passar “nos cobres” o patrimônio da sociedade.